(Des)montando uma peça.

Imagem do palco do Teatro União Cultural em São Paulo

Eram 22:15. Fim do espetáculo.

Foi combinado que às 22:30 todos estariam de volta para a desmontagem do palco. Aproveitei e fui fumar um cigarro. Não era justo fazer todos voltarem logo após a peça para finalizar o trabalho. Eles mereciam aquele momento após os aplausos. Os abraços, os beijos. Era a recompensa de um trabalho concluído. Um dia longo, com tempo curto. Mas finalizado. E eles mereciam esse momento.

13:00
Chegamos em ponto. Nem um minuto antes ou depois. Demoramos 30 (trinta) minutos para descarregar os carros com todos os objetos, incluindo cenário e figurino. Concentramos tudo em um lugar para não atrasarmos nem um minuto.

E 13:30, estávamos começando a  montar o palco, o espetáculo mais esperado por nós, pois era o dia em que sairíamos pela primeira vez da Escola Teatro Macunaíma. Era um palco novo. Com disposição de pernas e varas diferentes daqueles que eu conhecia. Tive dificuldades para pensar e organizar. Com meia hora acima do previsto, entregamos o palco pronto com os cenários. E agora era a hora de colocarmos em prática os desenhos da iluminação.

15:00
Começamos então a montar a luz. Achei que, em duas horas, conseguiríamos montar a luz e às 17:00 começaríamos o “passadão” com o cenário, iluminação e o áudio. Terminamos a luz às 19:00. Na verdade, terminamos às 19:20. Não foi do jeito que pensamos e infelizmente não era o nosso desejo, mas eu tinha que terminar para podermos testar a iluminação com os atores em cena.

20:00
Liberei todos para um pequeno descanso. Não consegui fazer um passadão com todas as cenas. Faltava apenas 1 (uma) hora para o começo do espetáculo e o descanso era necessário para que todos conseguissem tempo suficiente para o final da construção de cada personagem. Era o momento de focar. Desligar do externo.

21:00
Abrem-se as portas do teatro. Todos a postos. A música de abertura tocou três vezes pois às 21:05 ainda havia pessoas querendo entrar. Não lotamos, mas estava cheio.

22:25
Dei as minhas últimas tragadas no cigarro antes de apagar. Dei uma última olhada pelo saguão lotado de pessoas. Palavras de gratidão, sorrisos de agradecimento e alegrias ecoavam por todo o salão. Era impossível compreender uma palavra, mas o sorriso dos atores era nítido em seus rostos.

Um leve sorriso brotou em mim. Não de um trabalho bem sucedido, pois errei nos horários, no palco, na luz (sim, eu admito. Errei e sei das minhas responsabilidades e jamais fugirei destas), mas sim de um sorriso por estar fazendo parte de um grupo de atores em formação, entendendo o grande significado de fazer arte.

23:00
Entregamos o palco limpo. Todas as coisas dentro dos carros. Fiz questão de abraçar um a um, como uma forma de agradecimento. Antes de entrar no carro e partir, deu uma última olhada para a calçada da entrada do teatro. Ao fundo, o saguão que estava lotado a uma hora atrás, deu lugar a um outro escuro e sem vida. E logo, um aperto no coração.

Sei que haverá críticas individuais. E tenho certeza que o grupo aceitará isso como uma forma de melhorar. E a melhoria, ou a evolução, vem com o tempo. A técnica evolui o indivíduo. Mas teatro é grupo. E trabalhar em grupo é desprover de vaidade individual. É viver em sociedade, mesmo sendo uma pequena companhia. E exigir a perfeição é a mesma coisa que exigir que pessoas sorriam e se beijem toda hora. E esquecer os problemas – problemas esses no processo de criação, de implantação, de conclusão. E quem sou eu para exigir isso a eles?! Sou apenas um ex-aluno de teatro que se apaixonou através dos olhos de cada um desse grupo. Sou um pouco de cada um deles.

Sou um pouco de cada um que conheci. Por isso, mantenho a minha cabeça aberta para novos conhecimentos. Tivemos problemas técnicos? Sim, não nego. Mas crucificar um grupo inteiro pelo resultado final é esquecer que todo o processo tem um começo, meio e fim. Criticar uma peça pelo fim é esquecer o longo processo inicializado lá atrás com um sonho. Um sonho individual que foi conquistando adeptos, pessoas com o mesmo desejo, com a mesma vontade,  tornando-se algo em conjunto. E é por isso que faço parte desse grupo. E é por isso, também, que estou aqui “dando” a cara para receber as críticas em nome deles. Pois jamais deixarei que críticas por atuações individuais acabem com um sonho coletivo.

Que venham as críticas. Que venham até mim.

23:05
Sento no carro com as pernas doloridas. As costas querendo me afundar. E, mesmo assim, não escondo o sorriso que brotou horas antes. Aquele mesmo sorriso de gratidão. Que só com o tempo se transformará em um sorriso de realização.

Agradeço aqui ao grupo de teatro desempaco. Agradeço um a um: André, Guga, Thay, Tainã, Sandra, Gabi, Gui, Jana, Jenny, Bia e Walther. Isabella (áudio) e Jacque (luz).

Ao diretor Lucas de Lucca, pela confiança.

Ao roteirista Alberto Guiraldelli, pela presença e o aval para continuarmos a seguir com a peça O Beijo.

À Mônica Granndo, minha mestre de luz.

E ao Leo Bianco, por acreditar que todos os alunos de teatro podem se tornar um Ator Criador.

Um grande beijo a todos que compareceram, pois vocês sempre serão as nossas motivações para continuarmos a proliferar a arte do teatro pelo mundo afora.

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Rodrigo Kenji é Bacharel em Administração de Empresas / Estudou Direção para Cinema no Instituto Operahaus / Ator / Músico / Cenógrafo / Operador de Luz e Som.

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