Ópera do Malandro – Impressões sobre o Musical

Imagem Divulgação da peça Ópera do Malandro pela Cia. da Revista

Depois de assistir ao musical Ópera do Malandro, se você ainda duvidava da genialidade de Chico Buarque, ela com certeza dirá adeus à sua suspeita. Era preciso muito esmero com as palavras para construir uma obra de protesto com qualidade artística sobre aquele momento político brasileiro (a ditadura civil-militar entre os anos de 1964-1984), e isso Chico fez com maestria para este espetáculo. Tivesse apenas catapultado a desconhecida atriz paraibana Elba Ramalho para o estrelato no mundo da música brasileira, demonstrado a capacidade de direção cênica do saudoso Luís Antônio Martinez Correia e presenteado o público com canções que se tornariam verdadeiros clássicos da MPB, este musical já teria entrado para a história do teatro. Mas Chico fez mais do que isso. Ele demonstrou que é possível fazer musicais com temáticas brasileiras de forma inteligente e alegre. Por isso ele é imperdível!

Sua primeira encenação aconteceu no Rio de Janeiro no final dos anos setenta. As cenas mostram o submundo das profissionais do sexo e do contrabando. Corpos e objetos são tratados da mesma forma: meras mercadorias à venda. Há também a corrupção da polícia e da justiça. E, claro, o sonho de ver o povo nas ruas protestando contra a opressão do regime da época. Mas nada é feito de forma seca e panfletária, muito pelo contrário. É um discurso político com crítica social inteligente. Enfim, um texto primoroso a começar pela escolha dos nomes dos personagens.

É, sem dúvida alguma, um gesto de coragem da Cia. da Revista e do diretor Kleber Montanheiro o de trazer este espetáculo de volta aos palcos brasileiros. São quatorze atores e atrizes e mais três músicos contracenando, dançando e cantando. É bem provável que você se decepcione com algumas desafinações quando algumas músicas são entoadas, especialmente se comparados os desempenhos dos donos do palco com as interpretações de Maria Bethânia para Uma canção desnaturada e Teresinha, de Elba Ramalho para a canção O meu amor, de Zé Ramalho para Hino de Duran, de Gal Costa para Folhetim, de Zizi Possi para a belíssima Pedaço de mim e, finalmente, de Chico Buarque para as canções Se eu fosse o teu patrão e a incrível Geni e o Zepelim, eternizadas pela sua voz. Como se vê, foi um musical pródigo em parir clássicos para o nosso cancioneiro.

Alguns espectadores mais jovens poderão encontrar dificuldades em entender algumas referências do texto se não estiverem bem informados sobre a história dos últimos cinquenta anos deste país. Em um certo momento, por exemplo, uma personagem cita o advogado Doutor Sobral (uma alusão ao advogado católico Sobral Pinto, um defensor dos presos políticos à época). Outras referências políticas e artísticas importantes poderão passar despercebidas pelo espectador informado atualmente apenas pelas postagens do Facebook, mas nada que dificulte o entendimento da encenação. Apesar de ser datada, é uma obra política que, infelizmente, é sempre atual no Brasil. A duração do espetáculo (quase três horas) pode ser outro problema para os que estão acostumados com peças que duram cerca de 80 minutos.

Um aviso aos que pretendem ir ao CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil para ver este musical: todas as entradas foram vendidas antes mesmo de iniciada a temporada de apresentações. Há, ainda bem, a famosa fila da desistência. Mas não perca seu tempo se pretende chegar lá com menos de duas horas antes do início do espetáculo, as chances de assisti-lo no CCBB serão mínimas. O espetáculo ficará em cartaz na sede da Cia. Da Revista, ainda sem data definida. Vale a pena ficar de olho pra não perder essa segunda chance.

Informações sobre o musical Ópera do Malandro

Autor: Chico Buarque (com colaboração de Luís Antônio Martinez Correa, Maurício Leite, Marieta Severo, Rita Murtinho, Carlos Gregório e Maurício Arraes).
Direção: Kleber Montanheiro.
Encenação: Cia. da Revista.
Quando: De 08 a 31 de agosto (Qua. a Sáb. às 20hs; Dom. às 19hs; Seg. às 19hs.
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil.
Endereço: Rua Álvares Penteado, 112 – Centro / SP.
Quanto: R$ 10 (Ingressos esgotados, com possibilidade de ver o espetáculo esperando na fila da desistência).

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Flávio José Rocha trabalha com Teatro do Oprimido desde de 2005 e é um apaixonado por todas as formas do fazer teatral. É também doutorando em Ciências Sociais na PUC-SP e pesquisa temas relacionados à questão socioambiental.

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