XI CAMPEONATO CARIOCA DE IMPROVISAÇÃO

CAMPEONATO TEATRAL COM JEITO DE EVENTO ESPORTIVO

Dois times a postos, é o último jogo da partida. Os capitães são chamados ao centro. Do par ou ímpar, decide-se qual time irá começar a improvisar. É o jogo do Um minuto Reloaded: uma história deve ser contada nesse tempo, depois refeita em 30 segundos, 10 segundos e 5 segundos, mantendo-se a sua essência. O título sorteado da plateia: “Acabou o chucrute!“. O que se segue é uma cena improvisada por 3 atores, cuja história ninguém imaginaria ver no palco. Nem eles mesmos. A plateia bate palmas, vibra e torce pela cena. Esse é o espírito do Campeonato Carioca de Improvisação, que acontece nos meses de agosto e setembro de 2015 na sede da Companhia de Teatro Contemporâneo, em Botafogo.

Esta é a décima primeira edição do campeonato, que vai contar com quase 100 improvisadores. Os times são divididos entre a sério Ouro, formada por grupos iniciantes, e a série Platinum, com equipes mais experientes. Qualquer pessoa pode formar um time de três a seis integrantes e se inscrever no campeonato. Basta ter um nome, um uniforme, um hino e disposição para improvisar os mais diversos temas propostos pela plateia. Este ano, quinze times fazem parte da série Ouro, dos quais apenas cinco se classificarão para a série Platinum. Fim de semana que vem (22 e 23 de agosto) serão os últimos jogos e finais da série Ouro.

A grande final será no sábado seguinte, dia 29. No domingo começa a série Platinum, com os times classificados e os cinco times mais experientes que se inscreveram para jogar este ano: Imprudentes, Armacena, Frangos de Makumba, Bendita Fruta e Moloides. Esta edição não contará com dois grupos tradicionais e talentosos: Baby Pedra e o Alicate e Cachorrada Impro Clube. Apesar de não estar participando como grupo, os integrantes do Cachorrada se distribuíram generosamente por equipes iniciantes, além de estarem colaborando na produção e brilhando na apresentação do evento.

QUEM MANDA É A PLATEIA

Ao chegar ao teatro, o público recebe um papel onde poderá sugerir um título e um lugar, que poderão ser sorteados e usados como temas para as cenas improvisadas. Os formatos dos jogos são anunciados na hora da partida pelos apresentadores. São cenas de um, dois ou três minutos, nas quais as equipes deverão criar histórias aproveitando ao máximo os temas sorteados e respeitando as regras do jogo escolhido. Um dos jogos mais difíceis é a cena de três minutos com Gênero, Título e Lugar. Além dos dois últimos quesitos, sugeridos pela plateia, o grupo deve criar uma história dentro do universo de um determinado gênero que também será sorteado na hora. Os gêneros são pré-estabelecidos pela produção no edital do evento: Conto de fadas, Épico/aventura, Nelson Rodrigues, Musical, Novela Mexicana, Novela Brasileira, Policial, Faroeste, entre outros.

FORMATOS DOS JOGOS

Outro formato, é o jogo do Personagem Secundário, no qual apenas dois integrantes do time podem entrar em cena: um fazendo um personagem fixo e o outro assumindo todos os personagens secundários que surgirem na história. Temos também a Cena com Objeto da Plateia. Um objeto qualquer é oferecido e previamente escolhido pelos atores. Em seguida, eles devem criar uma cena utilizando o tal objeto de todas as maneiras possíveis, menos da forma convencional para qual ele serve. Por exemplo: se for escolhido um guarda-chuva, este pode servir na cena como espada, bengala, garrafa, taco de baseball, menos como um guarda-chuva. São quase vinte formatos de improvisação que podem ser escolhidos pela produção a cada apresentação. Cada partida é composta por três jogos, ou seja, três formatos diferentes. O segundo jogo é sempre uma cena colaborativa, na qual as duas equipes devem se misturar e atuar juntas. A cada jogo, dois juízes sobem ao palco para comentar as cenas e dar uma nota, de acordo com alguns critérios técnicos teatrais e das regras de improvisação. Depois, a plateia vota na cena que mais lhe agradou. No final do jogo, todos os pontos são somados para apontar o time vencedor.

IMPROVISAR É ACEITAR

Se por um lado, qualquer um pode formar um time e se divertir neste campeonato, por outro, a arte da improvisação é bastante complexa. A primeira regra da improvisação é não bloquear nenhuma proposta. Tudo que é proposto em cena deve ser generosamente aceito e acrescentado. Não se pode cair no lado oposto também, no sentido de apenas aceitar e não colaborar para a cena. É uma dinâmica sutil e delicada, uma negociação constante, entre as propostas dos improvisadores. Portanto, é preciso expandir a “escuta”, perceber as sutilezas nas sugestões dos parceiros e jogar com elas. Isto é apenas a base da brincadeira. Ainda existe uma infinidade de princípios de estrutura dramatúrgica e códigos de edição de cena. Além de habilidades corporais e mentais a serem desenvolvidas, para evocar ambientes consistentes no palco vazio e processar uma série de informações que vão sendo criadas ao longo das histórias.

ESCOLAS DE IMPROVISAÇÃO

No Rio de Janeiro, poucos grupos de improviso alcançaram carreiras reconhecidas e consistentes. O mais conhecido é o grupo Z.É.Zenas Emprovisadas (que revelou o comediante Marcelo Adnet). Por outro lado, o grupo mais consistente, com mais de dez anos de existências e pesquisas de formatos longos de improvisação, é o Teatro do Nada. Em São Paulo, a cena de “impro” é mais forte, com grupos como o Jogando no Quintal (que faz jogos de improviso com palhaços) e os Barbixas, provavelmente o grupo mais consolidado do Brasil. Na América Latina existem improvisadores de altíssimo nível técnico, como Marcelo Savignone, que dirige uma escola de teatro, e Omar Galván, que excursiona pelo mundo todo com espetáculos e oficinas, ambos argentinos; Gustavo Miranda, que dirige os Barbixas, da Colômbia; José Luis Saldaña, do México, entre muitos outros.

Nos Estados Unidos, mais especificamente em Chicago, ficam duas das escolas mais tradicionais de improviso do mundo: I.O. Improv Comedy e Second City, responsáveis por formar verdadeiros mitos. Na Inglaterra, também surgiram duas fortes referências: o programa de TV Whose line is it, anyway?, fez desta estética teatral um fenômeno de enorme popularidade midiática a partir da década de 1980. Além disso, o improvisador inglês Keith Johnstone é considerado pioneiro e um dos maiores organizadores teóricos dos conceitos de improvisação, que serviu, e ainda serve, de base para qualquer pesquisador do tema. Mas, como sabemos, esta arte já está presente em performances teatrais há muitos séculos. A Commedia Dell’Arte, movimento teatral italiano dos séculos XV e XVI, já trabalhava com técnicas de improvisação a partir de diversos roteiros dramatúrgicos.

IMPROVISAÇÃO CARIOCA

Neste momento, é lá na sede da Companhia de Teatro Contemporâneo que mais se fala, experimenta e se respira improvisação no Rio de Janeiro. O campeonato é um verdadeiro antro de viciados em impro e de pessoas em busca de uma diversão leve e descontraída para o fim de semana. Além deste evento, a companhia promove cursos regulares de improvisação (com os professores José Guilherme Vasconcelos e Rodrigo Amém), oficinas, encontros internacionais e espetáculos. Eu também sou um dos viciados nessa brincadeira. Faço parte do time Cenas Urgentes (C.U.), que formei com os meus talentosos parceiros Daniel Mendonça e Ursula Ribeiro. Nós acabamos de nos classificar para a série Platinum no último final de semana. Alto nível de emoção e adrenalina! Se você gosta de improvisação, não perca os próximos jogos do campeonato. Se você nunca ouviu falar disso, cuidado, pode acabar se viciando.

*Revisão e colaboração de texto: Ursula Ribeiro.

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Eduardo Katz
Eduardo Katz é ator formado na Uni-Rio, defendeu título de Mestre com pesquisa sobre trabalho autoral do ator Pedro Cardoso. Já trabalhou em teatro com os diretores Amir Haddad, Michel Bercovitch, Moacir Chaves e Wolf Maya; em cinema com José Wilker, Ruy Guerra e Marcos Prado. Participou como ator em programas e comerciais de TV, com destaque para o personagem "Zingo" na série de humor "Adorável Psicose" no canal MultiShow. Trabalhou também como arte-educador no Museu da Vida da Fiocruz e no Museu da Casa do Pontal. Leciona o teatro no Colégio Santo Agostinho no Rio de Janeiro.

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