O necessário não foi dito

Mostra Internacional de Teatro SP

Na abertura da 1ª Mostra Internacional de Teatro de São Paulo – MIT-SP – realizada no Auditório do Ibirapuera no dia 08 de março último, a Ministra da Cultura, Marta Suplicy, fez uma das falas da abertura oficial do evento. Alguns meses já se passaram, mas seu discurso quedou-se em minha mente pelo que foi dito e pela ausência das palavras que poderiam ter sido proferidas naquela ocasião.

A Ministra Marta Suplicy afirmou que o mundo teatral é, provavelmente, o campo das artes brasileiras que menos rendeu-se à internet, templo do contato cotidiano para bilhões de pessoas nos dias atuais. Estaria Marta sugerindo um link entre esta distância e a crise de público que atinge os teatros brasileiros? Embora sua afirmação tivesse boa intenção, sua constatação não condiz totalmente com a realidade. Existem ações por parte de várias companhias teatrais para utilizar o mundo cibernético em seus espetáculos. Há, inclusive, peças transmitidas pela internet em tempo real, como já o faz o Teatro Oficina, por exemplo. Conectar o teatro ao mundo virtual trará mais público? Será que o problema para a falta de público não tem outras origens? Por que então as pessoas continuariam indo aos espetáculos em vez de assisti-los na tela de um computador?

Ir ao teatro é entrar em contato com um drama, uma tragédia ou uma comédia e ter a possibilidade de, através do ator ou da atriz em cena, ativar um sentimento, por vezes, adormecido. É somente com a troca da energia entre o artista e a plateia que se dá a magia teatral. Esse contato é algo que penetra na pele do espectador e promove um momento de apreensão das emoções transmitidas pelas palavras que são condutoras das intenções do autor do texto representado. Talvez seja justamente por isso que o teatro seja o campo artístico que menos entre em contato com o mundo virtual. Se palavras têm sentimentos, ali no palco ou na rua não será possível escamoteá-las tão facilmente como no mundo do Facebook. Lá, atento ao que vê e ouve naquele momento mágico, as opções para o espectador são sentir ou não sentir. Não há meio termo ou fingimento por parte de quem assiste à encenação, como é possível acontecer nas relações virtuais. Não estou advogando a reprovação de novas linguagens com base na virtualidade cibernética, apenas defendo que elas não devam ser protagonistas a qualquer preço por uma questão de moda ou necessidade do mercado cultural.

Vejamos agora o que não foi dito na fala de Marta Suplicy e que também é importante. Nós ainda estamos muito carentes de formação de público para o teatro brasileiro. Reportagem do jornal Folha de São Paulo do dia 29 de julho último relata como os espetáculos estão em cartaz por cada vez por um tempo mais curto na capital paulista. “O público está cada vez menor”, afirmaram alguns entrevistados para a matéria do Caderno Ilustrada do referido periódico. Se isso está acontecendo na cidade de São Paulo, imaginem em outras cidades brasileiras. O que fazer para trazer as novas gerações para ver os espetáculos? Colocar milhões de crianças e jovens em contato com o mundo teatral será, sem dúvida, tão importante para o futuro desta arte no Brasil quanto o financiamento para as companhias teatrais. Por que ainda não temos uma campanha para que as escolas deste país tenham professores de teatro?

O teatro deve tornar-se um vírus a contagiar os mais jovens. Isto não será difícil de conseguir no Brasil, país apaixonado por espetáculos, mas ainda muito carente de formação para que a maior parte da população brasileira possa entender as linguagens, as abordagens e as metáforas do mundo teatral.

A internet jamais propiciará o contato humano permeado pelas emoções proporcionadas por uma encenação. Teatro, teatro e, mais uma vez insisto, teatro para humanizar um mundo cada vez mais resumido às telas dos computadores.

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Flávio José Rocha trabalha com Teatro do Oprimido desde de 2005 e é um apaixonado por todas as formas do fazer teatral. É também doutorando em Ciências Sociais na PUC-SP e pesquisa temas relacionados à questão socioambiental.

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